terça-feira, 3 de agosto de 2010

ANALISTA LIBERTA E CURA ATRAVÉS DO OUVIR







No dia a dia, passamos por situações estressantes, conflitos, desafios e uma série de dificuldades que resultam em ansiedade ou angústia, desde que me formei  Psicanalista há 08 anos , meu maior trabalho  como analista, é olhar para Eu mesma, buscando reequelibrar meu ser perante os fatos da vida,e ajudar aqueles que estão ao meu redor a olhar pra si mesmo.

Porém por mais que conheça , compreenda e exercite a auto análise, as vezes fica difíl encontrar a saida dos labirintos que a vida nos apresenta , como caminhos de crescimento, onde o objetivo é sempre expandir, não o corpo, mas a mente através da consciência.

Respondendo ao questionamento de uma amiga sobre doença e cura, e como  a análise pode ajudar, posso dizer que adoecemos como uma forma paroxistica de liberar o quantum energético acumulado na mente causado por incontados conflitos, sendo a doença uma manifestação, um sinal de algo que não está bem interiormente na mente.
  
Se entendemos por cura o restabelecimento da saúde, podemos dizer que em medicina o objetivo é o retorno a um estado de equilíbrio anterior à doença, compreendendo-se esta como uma perturbação do organismo sadio.

Em psicanálise, lidamos com estruturas psíquicas , com algo que foi paulatinamente construído e arquitetado, na história de vida  do indivíduo.
A proibição do incesto, norma constitutiva da própria condição humana, causa estruturante do corpo erógeno é a base de todos os conflitos na vida afetiva de um ser humano, pedra angular etiológica que desencadeia as neuroses manifestos nos relacionamentos consigo e com os outros, então, podemos falar de cura?

Penso que sim, uma vez que, o indivíduo encontra-se encapsulado em seu corpo erógeno, cheio de sensações que influenciam seu psíquico e a psicanálise lida com este sujeito aprisionado em si mesmo.

O analista  sabe que os sintomas satisfazem o indivíduo, pois  este constitui-se  num sistema onde algo se arranja. Caráter paradoxal que apontou Freud em "Inibições, Sintoma e Ansiedade" (1925) onde, ao mesmo tempo que o sintoma é fonte de satisfação, também angustia. O que leva Lacan a dizer: "até certo ponto é sofrer demais que é a única justificativa de nossa intervenção". (sem. XI p.158) Como o oleiro, o analista constrói um vaso em torno ao vazio.

Portanto curar em psicanálise é levar o indivíduo disposto a se conhecer a dar-se conta de uma história, da sua história ,que irá  mostrar-lhe o quanto ele é o agente de seus próprios avatares, dores e padecimentos.

"Pescar nas águas do inconsciente é algo mais que chegar a conhecer os peixes que habitam um elemento turvo". (Masotta)

Ao analisar um caso de exceção" no livro A Operação Psicanalítica, R.F.Couto diz:

"a análise pode progredir perfeitamente na ignorância de qual é o objeto transferencial".
E citando Pommier prossegue:

"Qualquer saber constituído, seja médico, psicológico, freudiano, lacaniano ou outro, será sempre um obstáculo para escutar um analisante em particular porque oporá seu próprio código de leitura à singularidade de uma palavra (...) A experiência do não-saber ( que nenhuma universidade sanciona) permitir-lhe-á escutar".

O analista não pode prometer a cura,  a felicidade e a harmonia, uma vez que, estas se situam além do princípio do prazer.
O que ele pode prometer é ajudar tanto paciente quanto aqueles que estão ao seu redor a  aclarar seus desejos  e a decifrar o que insiste numa existência.

Isto não significa que o Analista não aceita a particularidade de cada ser,  nem que esteja desprezando as noções de estrutura generalizáveis.

Pois  se não houvesse a generalização, não haveria nada sobre o que se analisar , sendo que as  generalizações nos ajudam a compreender as particularidades de cada um e de muitos grupos.

Para isso estudamos, lemos e discutimos de modo permanente com quem está a nossa frente de modo a compreender a singularidade de seu ser, isso não quer dizer que  seja para enquadrá-lo num rol nominativo.

Pois  aqui há  um grande risco que corre a psicanálise: a má interpretação de seus princípios. Se - como afirmou Lacan na proposição de 9 de outubro - o psicanalista só se autoriza por si mesmo, se não há saber prévio sobre o sujeito, se o silêncio é um grande recurso do analista, parece que não haveria nada a fazer.
É a inércia absoluta.Não se trata disso.

O psicanalista só se autoriza após anos de sua análise própria, a teoria psicanalítica é a base de todo o seu trabalho e o silêncio é um silêncio de saber, não sobre o objeto, mas sobre a importância da regra fundamental que permite ao sujeito associar livremente.

Esta renúncia ao saber é o que chamamos "douta ignorância".

"Ser analista é valer mais quando não se é que quando se é.

É amar na paixão da ignorância

É chegar, sem ser avisado, no lugar da surpresa ou da assombração".

Referencias:


FREUD, S. Ed. Standard Brasileira das Obras Completas de S. Freud [ESB] . R.J., Imago, 1986. Três Ensaios sobre a Sexualidade (1905), vol. VII.


FREUD, S. Ed. Standard Brasileira das Obras Completas de S. Freud [ESB] . R.J., Imago, 1986. A Psicanálise Silvestre (1910) vol. XI.


FREUD, S. Ed. Standard Brasileira das Obras Completas de S. Freud [ESB] . R.J., Imago, 1986. Psicanálise e Psiquiatria (1916-1917), vol. XVI.


FREUD, S. Ed. Standard Brasileira das Obras Completas de S. Freud [ESB] . R.J., Imago, 1986. Sobre o ensino da Psicanálise na Universidade (1919), vol. XVII.

FREUD, S. Ed. Standard Brasileira das Obras Completas de S. Freud [ESB] . R.J., Imago, 1986. A Questão da Análise Leiga (1926) , vol. XX.


HEIDEGGER, M. A Ciência não pensa. Entrevista concedida à TV Alemã ZDF no 80º aniversário. Tradução da Fundação Centro Psicanalítico Argentino.


LACAN, J. O Seminário. Livro 11. R.J., Jorge Zahar,1988.